Os tribunais de contas são órgãos auxiliares ao Poder Legislativo, que funcionam em âmbito federal, estadual e em alguns municípios. São responsáveis pela elaboração e votação de pareceres sobre as contas do Executivo.
Esta pesquisa, realizada na Universidade de Brasília, investiga de que maneira a atividade dos tribunais estaduais é avaliada, por meio do levantamento de informações sobre a transparência e a composição de cada um deles.
Entre as conclusões, o pesquisador destaca a organização e composição dos tribunais excessivamente vinculadas ao poder Executivo, embora os órgãos sejam responsáveis por fiscalizá-lo.
1• A que pergunta a pesquisa responde?
A pergunta de pesquisa que orienta este projeto é: a quem prestam contas os tribunais de contas? Logo, o objetivo deste estudo é indicar quem é a figura central na relação principal-agente dos TCs estaduais e distrital, por meio do levantamento e da aferição de informações sobre sua transparência ativa e sua composição.
Os tribunais de contas são representantes do Poder Legislativo na missão de fiscalizar o Poder Executivo, como define o artigo 71 da Constituição Federal, havendo protagonismo do Legislativo na nomeação da maioria dos “juízes” de contas . Todavia, considerando a destacada autonomia de fiscalização da entidade, e que também o Legislativo é alvo da sua fiscalização rotineira, seria possível sugerir que a sociedade é a real destinatária das ações dessa instituição de controle.
Porém, a resposta alternativa que se irá analisar neste trabalho é a de que os tribunais de contas funcionam de fato como agentes do Poder Executivo, devido à forma de composição dessas cortes de contas (nomeação política), à força do Poder Executivo nos estados — dominando inclusive o Poder Legislativo local — e à pouca interação entre sociedade civil e Tribunal, indicada por meio da qualidade de sua transparência ativa institucional.
2• Por que isso é relevante?
Os tribunais de contas são constantemente lembrados pela qualidade de sua equipe técnica e pela pujança de seus orçamentos. São financeiramente bem equipados e com corpo de servidores bem treinado. As esperanças que se depositam sobre a atuação dos tribunais de contas, portanto, são grandiosas. Todavia, em que pesem os avanços institucionais e a sua antiguidade, há desconfiança na sociedade e na academia sobre sua real efetividade como mecanismo de auditoria superior.
Essas agências são alvo de críticas frequentes quanto ao recrutamento dos conselheiros, à qualidade das decisões e relatórios e até mesmo em relação à própria transparência e accountability interna. Diante desse aparente paradoxo, apresenta-se como oportuno e proveitoso analisar que tipo de prestação de contas é possível esperar dos tribunais de contas e a quem ela é efetivamente destinada. Caso seja o Poder Executivo o real ator a quem a atuação dos tribunais de contas é destinada, não seria estranho verificar sua composição majoritariamente política e a pouca transparência de seus resultados e da sua estrutura. Por outro lado, caso seu agente principal seja a sociedade civil, esses resultados podem ser considerados como ineficientes ou insatisfatórios.
3• Resumo da pesquisa
A pesquisa tem por objetivo avaliar a quem se destina, objetivamente, as ações e os resultados dos tribunais de contas estaduais. A hipótese principal do trabalho é a de que os tribunais de contas atuam como delegados do Poder Executivo estadual e para esses prestam contas. Para sua verificação, três hipóteses foram lançadas: há correlação negativa entre politização e transparência; há predominância do governismo na politização e há correlação entre controle político e eleitoral e a nomeação de técnicos para os tribunais de contas. As variáveis de interesses para a pesquisa foram a transparência ativa, a politização e o governismo — todos relativos aos tribunais de contas—, e ainda o controle político e eleitoral do governador no estado. Quanto à discussão do problema e das hipóteses propostas, foi realizada ampla revisão da literatura sobre a teoria da accountability e a teoria principal-agente. Por fim, a apresentação de resultados dos testes e análises indica a confirmação da hipótese principal. Este trabalho verificou haver diversos indicativos de que os tribunais de contas funcionam como agentes do Poder Executivo e não da sociedade ou do Poder Legislativo.
4• Quais foram as conclusões?
Os resultados reunidos neste trabalho apontam para uma organização excessivamente vinculada ao Poder Executivo. Foi constatado alto índice de politização nos tribunais de contas, ultrapassando por vezes o limite constitucional estabelecido. No total, 26 tribunais não possuíam conselheiros de carreira burocrática além do mínimo constitucional. O percentual de “politização” chegou a ultrapassar esse limite em seis casos. Buscou-se medir o governismo dentre as nomeações políticas e assim definir com maior clareza se é o Poder Executivo quem tem maior predominância na composição do tribunal. Os resultados indicaram a comprovação dessa hipótese. No agregado total das 136 observações de conselheiros políticos, 81% (111) foram considerados “governistas”, 86% quando removidos os casos sem classificação. Como oposição, foram encontrados 13% (18) dos casos. Em 11 estados, inclusive, houve 100% de conselheiros governistas em relação ao total de nomeações políticas. Com a pouca ocorrência de nomeação de conselheiros tidos como de oposição, foi mais seguro apontar que a composição política dos TCs segue os interesses do Poder Executivo. Portanto, seria ao Poder Executivo que os TCs deveriam prestar contas.
5• Quem deveria conhecer seus resultados?
Os resultados deste trabalho podem ser considerados inovadores ao apontar não só a politização dos tribunais de contas, mas também sua relação íntima com o Poder Executivo. Os achados dão conta de um órgão controlador majoritariamente ocupado segundo interesses do governo estadual. Tais resultados podem ser especialmente úteis a pesquisadores e a organizações que trabalham com os temas accountability, instituições de fiscalização superior e transparência pública. Acima de tudo, é de fundamental importância informar o cidadão e a sociedade civil que seus órgãos de controle podem não estar atuando no estrito interesse social, mas para atender os interesses dos órgãos fiscalizados.
Fonte: Guilherme Brandão/Nexo Jornal
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