Senhores Senadores,
A Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU), entidade de âmbito federal de representação homogênea que congrega os Auditores Federais de Controle Externo-Área de Controle Externo do Tribunal de Contas da União, a Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) e a Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP), força associativa de entidades do funcionalismo público, entidade de classe de âmbito nacional integrada exclusivamente pelos Auditores de Controle Externo do Brasil assinam a presente Carta Aberta, ante a iminente escolha, pelo Plenário do Senado Federal, de candidato para a vaga de Ministro do Tribunal de Contas da União, vêm à presença de Vossas Excelências tecer ponderações que consideram de extremo relevo sobre o ato complexo envolvendo a indicação, nomeação e posse de Magistrado de Contas, cargo vitalício para o qual a Constituição da República assegura as mesmas prerrogativas e impõe os mesmos impedimentos e vedações de Ministro do Superior Tribunal de Justiça-STJ.
A Constituição de 1988 exige mecanismos diferentes para ocupação dos mais altos cargos das instituições republicanas. Para ingresso nos cargos eletivos de ocupação temporária dos Poderes Executivo e Legislativo, o art. 14 da Constituição da República delegou à lei complementar a definição dos requisitos de inelegibilidade, atualmente fixados pela Lei da Ficha Limpa, a qual, embora inaugure importantes avanços em relação à Lei Complementar nº 64, de 1990, não foi aprovada tal como o Projeto de Lei de Iniciativa Popular foi concebido, impedindo o registro apenas de candidato com sentença condenatória proferida por órgão colegiado.
Já os requisitos para ingresso nos cargos vitalícios da Magistratura, do Ministério Público e dos Tribunais de Contas são bem mais restritos em relação aos fixados pela Lei da Ficha Limpa para os cargos eletivos sujeitos ao sufrágio universal.
O requisito referente à reputação ilibada, por exemplo, não se restringe ao cargo vitalício de Ministro do TCU (art. 73, II), sendo igualmente exigido para indicação, nomeação e posse de Ministros do Supremo Tribunal Federal-STF (art. 101), Ministros do STJ (art. 104), Desembargados dos Tribunais Regionais Federais (art. 94), membros dos Conselhos Nacionais de Justiça (art. 103-B) e do Ministério Público (art. 130-A), dentre outros cargos previstos constitucionalmente.
Para ingressarem no cargo vitalício de Magistrado, os candidatos devem apresentar, por exigência do artigo 58 da Resolução do CNJ nº 75, de 2009, certidão dos distribuidores criminais das Justiças Federal, Estadual ou do Distrito Federal, assim como apresentar folha de antecedentes da Polícia Federal e da Polícia Civil Estadual ou do Distrito Federal, onde haja residido nos últimos 5 (cinco) anos. Diferentemente, acusados em ações de improbidade e denunciados por tráfico de drogas, por exemplo, poderiam exercer a função de magistrado enquanto não fossem condenados pelo Judiciário. O conceito de reputação ilibada, por certo, não comporta esse tipo de contradição.
Os candidatos à Magistratura Nacional devem, ainda, declarar que nunca foram indiciados em inquérito policial ou processados criminalmente ou, em caso contrário, notícia específica da ocorrência, acompanhada dos esclarecimentos pertinentes, o que se justifica para casos de menor potencial ofensivo.
Não se pode exigir requisito menor para ingresso no cargo vitalício de Ministro do TCU, sob risco de, além de comprometer a credibilidade da instituição de controle externo, criar precedente perigoso para ingresso nos demais cargos constitucionais mencionados, cujos atos de indicação, nomeação e posse devem ser guarnecidos pelos mesmos cuidados de verificação da reputação ilibada. Para desfrutar das prerrogativas de Magistrado do STJ, é necessário que o candidato ao cargo de Ministro do TCU cumpra os mesmos requisitos e impedimentos impostos a toda magistratura nacional, os quais vão muito além da Lei da Ficha Limpa.
A possibilidade de verificação objetiva dos requisitos de reputação ilibada e de idoneidade moral não é novidade. Decisões nesse sentido podem ser encontradas em diversos julgados da Corte Suprema e adotadas pelo STJ, sendo vários os precedentes. Quanto à presunção constitucional de não-culpabilidade, os signatários esclarecem que tal previsão não impede que se tome como prova de maus antecedentes de um acusado a pendência contra ele de inquéritos policiais e ações penais.
Não se pode tomar por absoluto – e a jurisprudência do STF não o faz – o princípio da presunção de inocência, de forma a deixar a Administração Pública, os bens do povo, totalmente desprotegida, de modo a permitir a indicação de nomes impróprios ao exercício de cargos vitalícios de estratégica envergadura constitucional. O STF já decidiu, desde o julgamento do recurso Extraordinário de Ação Popular 167.137-8-TO, que os requisitos de idoneidade moral e reputação ilibada tornam os atos administrativos de indicação, nomeação e posse vinculados aos parâmetros objetivados pela Carta Política. Entende o STF que só se pode afirmar a falta de idoneidade moral após a condenação, mas a reputação ilibada resta atingida já com a existência das ações.
Ainda de acordo com a Corte Suprema, por se tratar de ato vinculado, o Judiciário, quando provocado, não só pode como deve aferir a presença ou, ao contrário, a ausência dos requisitos constitucionais exigidos pelo artigo 73, § 1º da Constituição de 1988. E conclui: “É possível o aferimento, no caso concreto, se o aplicador da norma agiu dentro dos limites que lhe foram conferidos para aplicar a norma que contém, em sua hipótese, um conceito indeterminado. E esse aferimento se dá com a análise objetiva dos pressupostos fáticos relacionados, ou subsumidos, à norma, como, inclusive, já foi dito pelo STF”.
Em outro precedente, o STF assentou que os “atos que compõem a cadeia do grande todo – o ato complexo – hão de estar em harmonia com a Lei Maior do País, daí a possibilidade de o Tribunal examinar se aqueles constantes da lista sêxtupla atendem, ou não, aos requisitos constitucionais, da mesma forma que o autor do último, completando a cadeia, pode também fazê-lo” (MS 25.624-9).
Nesse sentido, é dever do TCU, na condição de guardião da Constituição da República no que diz respeito à fiscalização dos atos de pessoal, atuar de forma a garantir que o requisito constitucional de reputação ilibada seja igualmente aplicado quando da indicação, nomeação e posse de todos os cargos vitalícios previstos constitucionalmente, não podendo o TCU constituir parâmetro para a flexibilização do requisito constitucional que visa assegurar a moralidade da Magistratura Nacional e a higidez de suas decisões.
Diante de todo o exposto, as signatárias pedem aos nobres Senadores que zelem pelo requisito que constitui filtro constitucional para assegurar a credibilidade não apenas do TCU, mas também do STF, do STJ e do Ministério Público.
Fonte : https://audtcu.org.br/comunicacao/notas-publicas/1221-carta-aberta-aos-senadores-da-republica
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