A Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União | AUDTCU, com apoio da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) e da Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP), vem a público desagravar os Dirigentes e os Auditores de Controle Externo que integram, na Secretaria Extraordinária de Operações do Tribunal de Contas da União (SeinfraOperações), a equipe de fiscalização que acompanha o processo administrativo instaurado pelo órgão de controle interno do Poder Executivo federal (Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União) com vistas à celebração de acordo de leniência com a Construtora Norberto Odebrecht, o que é objeto de regular fiscalização prevista pela Instrução Normativa TCU nº 74, de 2015, em processamento no bojo do TC 035.857/2015-3, da relatoria do Ministro Bruno Dantas.
Em razão de atuação funcional diligente no cumprimento da IN TCU nº 74, de 2015, a Unidade Técnica do Órgão de Instrução do TCU e seus integrantes têm sido alvo de graves e desmedidas críticas e ofensas pelos dirigentes do órgão de controle interno do Poder Executivo federal e da Advocacia-Geral da União, Wagner de Campos Rosário e Grace Mendonça, em termos inverídicos e incompatíveis com o que a sociedade espera de tais órgãos federais.
É de se estranhar que servidores do órgão de controle interno do Poder Executivo federal, que tem o dever constitucional de apoiar o controle externo e dar ciência ao TCU “de qualquer irregularidade ou ilegalidade”, sob pena de responsabilidade solidária (artigo 74, inciso IV e § 1º da Constituição da República), atuem para obstruir o cumprimento da missão da instituição prevista constitucionalmente para exercer o controle externo, de forma autônoma e independente, de todos os atos administrativos praticados por quaisquer órgãos e entidades da Administração Pública federal, sendo inconcebível a inversão de papéis que se extrai desse episódio infeliz.
Cabe destacar que os Auditores de Controle Externo do TCU exercem, de forma impessoal e técnica, suas atribuições constitucionais, legais e regimentais referentes à fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos atos administrativos praticados por todos os Poderes e órgãos da União e das entidades da administração indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, sendo, portanto, descabidas as declarações dos Ministros de Estado no sentido de que a área técnica da Corte de Contas “tem sistematicamente embaraçado o livre fluxo” do que denominam “política de leniência” no Aviso Interministerial nº 02/2018/AGU/CGU.
A necessidade dessa fiscalização independente pela instituição autônoma de controle externo fica evidente pela robustez dos depoimentos de executivos da Construtora Odebrecht feitos à Força-Tarefa da Operação Lava-Jato, ocasião em que reconhecem terem sido feitas pressões junto ao Poder Executivo para aprovação da Medida Provisória nº 703, de 2015, também conhecida como ‘MP da Leniência’, cujos trechos dos depoimentos foram amplamente divulgados pela imprensa nacional1. O objetivo da referida MP, todos sabem, foi flexibilizar a celebração de acordos de leniência de forma a facilitar a obtenção de financiamentos subsidiados de bancos públicos federais.
Não se pode olvidar que a ‘MP da Leniência’, com os propósitos antirrepublicanos confessados pelo executivo da própria organização que fraudou licitações públicas em valores vultosos, resultou de proposta conjunta2 formulada nos termos da Exposição de Motivos Interministerial nº 00207/2015 MP/AGU/CGU/MJ, que teve como signatários os mesmos órgãos federais que hoje se valem de estratagemas para fazer intriga na Corte de Contas e tentar desqualificar a atuação independente, impessoal, serena e leal dos Auditores de Controle Externo do TCU.
Frise-se que o descabimento da perigosa inversão de papéis que o controle interno do Poder Executivo federal pretende instaurar na condução dos acordos de leniência na esfera administrativa foi rechaçada pelo Procurador-Geral da República no Parecer proferido na ADI nº 5.466, ajuizada no Supremo Tribunal Federal com argumentos formulados pela AUD-TCU e ANTC, merecendo destaque a seguinte passagem:
“Por outro lado, a norma promove inversão dos papéis constitucionais atribuídos aos órgãos de controle interno e externo. Os primeiros não detêm poder sancionador (ao contrário dos tribunais de contas23) e auxiliam o controle externo, apoiando a atuação dos tribunais de contas, na forma do art. 74, IV, da Constituição.24 Segundo a MProv, a celebração de acordo de leniência por parte de órgão de controle interno passaria a afetar o exercício do controle externo, independentemente da participação deste, o que não é constitucionalmente aceitável.” (grifei)
Os procedimentos instaurados para a fiscalização dos atos administrativos que possam resultar na celebração de acordos de leniência pelos órgãos e entidades do Poder Executivo federal constituem processos formais de controle externo, para os quais são sorteados Ministros relatores que o conduzem nos termos do artigo 11 da Lei nº 8.443, de 1992, do Regimento Interno da Corte de Contas e da IN nº 74, de 2015.
Registre-se que o Procuradoria-Geral da República se manifestou, por meio de Parecer3 que apreciou a ADI nº 5.294, pela constitucionalidade da IN TCU nº 74, reafirmando a inserção, nas competências constitucionais do TCU, do controle externo de processos de celebração de acordos de leniência na administração pública federal, “porquanto envolvem atos que podem provocar lesão grave ao patrimônio público”. Ainda segundo o Parecer, é “compatível com o regime constitucional do controle externo do TCU a edição de ato regulamentar que discipline remessa de documentos e informações de seu interesse institucional, com estabelecimento de prazos e de multa por descumprimento injustificado”.
Dessa forma, os ataques constantes do Aviso Interministerial em referência não visam desacreditar apenas as Unidades Técnicas do Órgão de Instrução do TCU, atingindo também o Ministério Público de Contas e os Ministros relatores, que atuam com independência funcional em todos os processos de controle externo dessa natureza.
Dado o histórico contrário ao interesse público envolvendo a Construtora Odebrecht, a estratégia de ataque ministerial à Corte de Contas mais parece uma tática óbvia de defesa de quem não dispõe de fundamentos jurídicos suficientes para sustentar a higidez de acordos celebrados às cegas, o que pode haver no caso em discussão – sem que se saiba precisar, em razão da descabida sonegação das informações – repercussão sobre o ressarcimento de eventual dano causado ao erário, matéria da competência do TCU prevista no artigo 71, inciso II da Lei Maior.
Por essa razão, o TCU não pode se furtar de exercer sua missão constitucional de fiscalizar os acordos de leniência celebrados pela via administrativa que envolvem interesses econômicos, ainda mais quando a história recente demonstra prática de captura política por meios antirrepublicanos.
A AUD-TCU louva e agradece, publicamente, a manifestação do relator do processo em questão, Ministro Bruno Dantas, endereçada à Presidência do TCU, a qual esta entidade teve acesso e autorização para reproduzir, o que faz com destaque para os seguintes trechos do importante documento de defesa da autonomia da Corte de Contas:
“1) Ao longo de todo o processo foi irreparável a atuação da equipe de auditoria designada pela SeinfraOperações para atuar no caso.
2) Ao tempo em que atentaram para a necessidade de manter este relator informado de graves intercorrências, os auditores adotaram, em seus atos e pronunciamentos, posições adequadas, prudentes e absolutamente leais à instituição que integram.
3) Os recentes e inusitados desdobramentos da aludida fiscalização são a evidência mais contundente do quão compreensiva e ponderada foi a postura da equipe de auditoria, diante do pressuposto de que são honrados os compromissos institucionais assumidos quando há uma perspectiva de lealdade, respeito e parceria norteando o relacionamento dos órgãos estatais.” (grifei)
Lamentáveis insultos aos Auditores de Controle Externo e aos Dirigentes das Unidades Técnicas do Órgão de Instrução do TCU em razão de seu ofício atingem e maculam todo o Tribunal de Contas da União, e mesmo todas as instituições autônomas de controle do Estado.
Por essas razões, a AUD-TCU deplora veementemente as afirmações dos Ministros da Transparência e Controladoria-Geral da União e da Advogada-Geral da União e repudia qualquer tentativa de intimidação com ataques, intrigas, pressões e difamações públicas dirigidas aos Auditores de Controle Externo e membros da mais Alta Corte de Contas do País.
A Associação assegura à população que os Auditores de Controle Externo do TCU continuarão exercendo a fiscalização das licitações sobre obras públicas e das propostas de acordos de leniência na esfera administrativa, com a mesma independência, impessoalidade e segurança técnica – que diferencia as fiscalizações de obras públicas realizadas pela referida classe -, em cumprimento ao disposto nos artigos 70 e 71 da Carta Política, nos artigos 11, 86 e 87 da Lei nº 8.443, de 1992, na IN TCU nº 74, de 2015, e demais legislação concernente, com o apoio irrestrito da AUD-TCU, da ANTC e de todos os Auditores de Controle Externo do Brasil.
Brasília, 11 de julho de 2018.
LUCIENI PEREIRA, Presidente da AUD-TCU e
Diretora da ANTC Diretora da CNSP
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